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sexta-feira, 3 de julho de 2015

Espalharam a fome e a miséria e ainda vêm aos nossos úteros

Diogo Pimentão, We find wildness


Bem podem dizer muitos católicos que a Igreja evolui e que o grupo talibânico de Isilda Pegado é uma minoria que não os representa. Podem dizê-lo sem grandes consequências, a verdade é que, a coberto da apresentação de uma petição abjecta vinda deste grupo, o governo apresentou, à revelia da participação dos principais intervenientes na área, a proposta de implementação de taxas moderadoras para o acto médico da ivg bem como o fim da baixa médica para a mulher que interrompe voluntariamente a gravidez. O CDS, aquele partido dos 11% que governa o país como se representasse metade dos votos que elegeram os dois partidos em coligação, vai mais longe que o PSD e diz que está disposto a apoiar algumas das ideias da petição como a consulta ao homem que participou na fecundação. Se for possível imaginar tal processo ficamos sem saber para que serviria esta consulta, para ficar em acta? O que sabemos é que, a poucos meses do fim desta legislatura, este governo pretende deixar de forma cobarde, anti-democratrcamente, como foi apanágio do seu mandato, mais uma marca das suas políticas de retrocesso social e político.
E o que já sabíamos mas não será demais lembrar é que a ideologia do CDS se revê na ideia da mulher tutelada por um homem, ao espírito de um certo tempo de uma certa época. É a este partido que compete a responsabilidade, por exemplo, da Segurança Social, impregnando com as suas ideias de desigualdade um instituto que é um garante da coesão social. Impregnando de lugares para os boys este ministério como no do Ambiente, como já o tinham feito na Defesa no tempo do governo Durão Barroso, aumentando, à maneira de um conde de Abranhos, a sua influência como nunca o fariam se ela resultasse de uma representação política. O partido que recebeu directamente na sua conta bancária (do BES bem entendido) dinheiro da venda de submarinos é o partido responsável pela venda da TAP. É difícil encontrar pior no espectro partidário português da última década. É nesta coerência na sujeira que a petição pelo direito a nascer encontra eco nas suas propostas de aviltamento da mulher. Não há contradições, quem se comporta e age no mundo para que ele seja mais desigual e injusto será o primeiro a atacar um gesto de liberdade, como é, neste caso, o da mulher ser dona do seu corpo.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Já abortei e estou muito bem, obrigado.


 Não há paciência para a reacção que não tem limites, nomeadamente todo e qualquer documento destinado a adolescentes ou mulheres que estimulem um sentimento de auto-flagelação preventiva. Ainda assim a vagina dentada achou por bem enviar um mail ameaçando divulgar o porquê do boicote a tal documento.


quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Do Galo Gallardón ao Patto Choco

"Em artigo no Público, «Pelo direito a nascer», o Juiz Pedro Vaz Patto afirma que, «na sequência da vitória do "sim" no referendo, o aborto por opção da mulher até às dez semanas de gestação foi não apenas despenalizado (como decorria claramente da pergunta), mas também legalizado, isto é, passou a ser realizado com colaboração directa ou indirecta do Estado, em estabelecimentos de saúde públicos ou legalmente autorizados». E considera, por isso, ser «difícil afirmar que, contra o que propugnavam muitos partidários do "sim" no referendo de 2007, o aborto não é fomentado, promovido e incentivado pelo Estado».

Sem rodriguinhos de linguagem, o que Vaz Patto está a dizer é que, desde a vitória do "Sim" no Referendo sobre a descriminalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG), o aborto passou a ser «fomentado, promovido e incentivado pelo Estado», apontando, logo de seguida, «as consequências deste regime»: para Vaz Patto, «aproximadamente uma em cada cinco gravidezes termina em aborto voluntário, sendo que um quarto destes corresponde a repetições». E mesmo reconhecendo, a custo, uma evidência que o próprio não nega nem poderia negar (o facto de «o número absoluto [de abortos "por opção da mulher" ter] descido ligeiramente»), procede ao remate final do seu argumento: «a proporção entre abortos e nascimentos (cujo número absoluto ainda desce mais) vai subindo de ano para ano».
"o número de interrupções voluntárias de gravidez por opção da mulher passou aproximadamente de 19.500 em 2010 para cerca de 17.400 em 2013 (registando portanto uma redução na ordem dos 11%, que não pode ser qualificada - como faz Vaz Patto - de «ligeira descida»)

um pingo de escrúpulos, não há Dr. Vaz Patto? 

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Para começar e terminar logo de seguida: o corpo dos outros não vos pertence

"Vemos os mais desfavorecidos, os mais excluídos, investirem com paixão o sistema que os oprime, e onde encontram sempre um interesse, visto que é aí que o procuram e avaliam. O interesse vem a seguir. A anti-produção espalha-se pelo sistema: amar-se-à a anti-produção por si mesma e o modo como o desejo se reprime a si próprio no grande conjunto capitalista. Reprimir o desejo, não só o dos outros, mas também o nosso, ser o chui dos outros e de nós mesmos -é isto que dá tesão, e isto não é ideologia: é economia.


O capitalismo recolhe e possui o poder dos fins e dos interesses (o poder) mas tem um amor desinteressado pelo poder absurdo e não possuído da máquina. Com certeza que não é para ele nem para os seus filhos que o capitalista trabalha, mas para a imortalidade do sistema. Uma violência sem sentido, alegria, pura alegria de se sentir uma peça da máquina, atravessada por fluxos, cortado pelas esquizes. Põe-se assim na posição em que se é atravessado, cortado, enrabado pelo socius, à procura do lugar onde, de acordo com os objectivos e com os interesses que nos são impostos, se sente passar algo que não tem interesse nem objectivo. Uma espécie de arte pela arte na líbido, um certo gosto pelo trabalho bem feito, cada um no seu devido lugar, o banqueiro, o chui, o soldado, o teconocrata, o burocrata, e porque não o operário,  o sindicalista...O desejo fica pasmado".

O Anti-Édipo - Capitalismo e Esquizofrenia, Gilles Deleuze e Félix Guattari, Assírio e Alvim, 1995 (1966), p.363.

domingo, 5 de outubro de 2014

Nascer é uma Utopia

O futuro é uma utopia. Algo que não tendo realidade no presente se pode constituir. Como a vida de um ser humano, não tendo realidade pode constituir-se como utopia, desejada por futuros progenitores, ou na forma colectiva de futuro comum da espécie. Em termos demográficos esse futuro de gente não se encontra ameaçado, bem pelo contrário, a população humana da Terra não tem parado de crescer. Por outro lado nas célebres Memórias de um Zigoto podemos ler: "quando descobrimos que lá fora havia gente a acender velas para que vissemos a luz do dia e que essas pessoas eram o César das Nevez, dirigentes do PNR, skin heads nazis, e católicos ultra-conservadores, começaram os problemas. Era necessário quebrar o silêncio, lá por não existirmos, nem juridicamente nem de outra forma socialmente reconhecida, não quer dizer que nos prestemos a tudo. Nascer nestes termos tornou-se uma condenação".

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Tira o rosário do meu ovário

Há um ano atrás, depois de ter ido assistir às comemorações oficiais do Cinco de Outubro no Largo do Município onde o o hino nacional e o hastear da bandeira foram submergidos pelos gritos DEMISSÃO DEMISSÃO DeMISSÃO dos que se tinham ali juntado, cruzei-me na avenida da liberdade com um grupo estranho. Pessoas vestidas de branco, algumas com balões, cantavam o Alecrim Alecrim Dourado que nasce no Monte sem Semeado. Algumas vinham com bebés ao colo e crianças pela mão. Que seria aquilo? Tentei perceber melhor mas o tom esganiçado de alguém ao megafone não deixava descortinar o teor do encontro. Eram muitas e muitos, e lá fomos entendendo porque vinham com rosários e alguns de bíblia na mão e empunhavam cartazes com fotografias de crianças. Esta gente não tinha vindo celebrar a república nem passear pela avenida num dia de sol. Vinha em família reinvicar os direitos daqueles que não nasceram a poderem fazê-lo. Portanto uma amálgama de gente inexistente que de repente se encontraria representada, à força, por este discurso. Representar os fantasmas é de génio, porque é um manancial muito dado à vastidão e ao silêncio. Estes amigos do incomensurável vão voltar a passear pelas ruas de Lisboa amanhã, eu gostava de ter tempo para os ir entrevistar e saber das suas propostas no que diz respeito ao muito comensurável problema das crianças institucionalizadas que não encontram famílias que os adoptem, ou que os consigam adoptar. Ao muito palpável problema do aumento da pobreza no país que tem levado ao aumento da entrega de crianças a instituições. Esta gente não diz que é contra a despenalização da IVG mas é a isso que vêm, tentar pôr os rosários nos nossos ovários. Rosários de hipocrisia à Jonet - alguém que não exerce uma profissão há duas décadas sem ser ocupar-se do banco alimentar vem dizer que há um negócio da pobreza em Portugal e que os pobres não querem trabalhar.