domingo, 1 de novembro de 2015

"Sacrifica-a antes pela próstata, homem!" ou como uma ideia de masculinidade mata homens cisgénero (para além de mulheres, gays, queer, trans) e como os babeiros misóginos-totós tentam obter uma aura de responsabilidade social quando são só merda


Aí está "Movember": uma campanha de alerta para o cancro da próstata e dos testículos iniciada por uma ONG que é, actualmente, uma campeã de recolha de donativos.

"Movember" é uma espécie de resposta ao "Pinktober", mês dedicado à luta contra o cancro da mama. Haveria logo aqui pano para mangas mas, em última análise, qualquer campanha mensal de luta contra qualquer cancro é uma coisa que pode sempre ter óptimos resultados por mais pano para mangas que haja nas suas motivações. O que me interessa trazer aqui à discussão é que o cerne de "Movember" é uma ideia de masculinidade que se manifesta em toda a sua perversão: a campanha recorre à ostensão de bigodes como expressão testosterónica simbolicamente compensatória do toque rectal, o meio de diagnóstico primário precoce do cancro da próstata. E eu não preciso de me alongar muito nisto, penso, porque a ideia machista "masculino-penetrador-nunca-penetrado" é um jogo que eu não inventei e que não jogo. Não deixa de ser irónico, portanto, que a estratégia de quem pretende chamar a atenção para o flagelo que é um cancro da próstata, sendo qualquer cancro um flagelo, passe não por afirmar taxativamente que a ideia de masculinidade está a matar homens cisgénero, mas por passear uma das causas do problema com orgulho.

Quanto às relações entre "Movember" e racismo, sexismo, misoginia, homofobia, transfobia sugiro a leitura deste artigo e deste.

Por fim, porque estas coisas reverberam sempre em forma de paródia em território nacional, informo que ontem apanhei num telejornal uma "notícia" sobre a adesão da barbearia Figaro's à campanha, retratando os barbeiros-misóginos como um exemplo de responsabilidade social. Foda-se, é só rir.

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